14.10.16

dezenove

Hoje eu dormi pra esquerda e foi assim
Que uma pedra tocou na outra
Veio a lembrança e a gente não sabe muito bem
Como isso acontece mas
Vieram os dias que eu voltava
Com purpurina nas mãos tilintando moedas
Na fila da padaria junto a pessoas de vidas mais extensas
Amores bem vividos e cartões para bater na hora certa
De gente que trabalha aos domingos
Vinha bambeando em minhas botas desejando ter
Um corpo apenas para me apoiar um corpo de voz baixinha pra
Telefonar e saber se cheguei em casa bem e eu acordaria só
Pra dizer que sim, ensaiaria até mesmo um
Cheguei, meu bem
Pra que ele dormisse tranquilo com meu perfume entre os dedos

Hoje eu dormi desse jeito que evocou alguma coisa e 
Foi assim que veio um frame daqueles dias
Que eu voltava pra casa na hora da missa dos meus 
Vizinhos e tirava os sapatos ainda no asfalto eu
Não tinha esse discernimento eu nunca
Tive paz
Era tempo de ter muitos amigos, eu tinha
Era tempo de achar que um último amor era
Realmente o último
Era tempo de deixar minha mãe preocupada com os ônibus
Que eu pegava com as companhias que eu cismava que eram gente finíssima
Amizade duradoura desde o fim de semana retrasado

Eu dormi sem saber se fui feliz ou triste e realmente
Não saberia fazer essa conta mas despenquei
Como dormia de volta pra casa nos taxis
Com a tranquilidade e a melancolia de quem ainda tem
Três quartos de século pela frente

Eu só não tenho dezenove anos